Três medidas provisórias (MPs) editadas pelo governo federal com o objetivo de enfrentamento da pandemia do novo coronavírus estiveram em debate, na tarde desta quinta-feira (20/08), no Seminário de Direito Cooperativo da Região Sul, promovido pela Faculdade de Tecnologia do Cooperativismo (Escoop), em parceria com os Sistemas Ocergs, Ocepar e Ocesc. O objetivo foi esclarecer as principais mudanças que as MPs trouxeram e os impactos no cotidiano laboral das cooperativas. O evento ocorreu virtualmente, por meio da plataforma Microsoft Teams, reunindo cerca de 90 participantes, e foi aberto pelos presidentes da Ocergs, Vergílio Perius, e da Ocepar, José Roberto Ricken. O presidente da Ocesc, Luiz Vicente Suzin, foi representado pelo assessor jurídico, Gilson Flores.
Lei cooperativista – Para Perius, estar em conformidade com a legislação é um dos requisitos para uma cooperativa ser bem-sucedida e o processo se completa com uma boa gestão e governança. Ele lembrou que no ano que vem a Lei 5.764, que rege o cooperativismo, completa 50 anos. “A lei nasceu bem. Foi a manifestação do desejo de termos um cooperativismo moderno e experiências da Europa, França, Itália e algumas da Argentina foram trazidas para o nosso ordenamento jurídico. Ela também representou um clamor por mudanças e pela libertação da tutela do Estado, que só a Constituição de 1988 conseguiu afastar. Hoje, o Estado tem o papel de incentivar e promover o cooperativismo, nunca atrapalhar, e isso deve se refletir em todas as normas legais”, disse o presidente da Ocergs.
Atual e apropriado – Na avaliação do presidente da Ocepar, a pandemia do novo coronavírus provocou mudanças profundas e o setor deve estar preparado para os desafios que vêm pela frente. “O tema desse seminário é atualíssimo. É o que temos que discutir agora e realmente ir a fundo nessas questões de ordem legal porque a pandemia mudou tudo. Foram destruídos mais de 1,2 milhão de empregos formais após a decretação da pandemia no Brasil. Imagine no mundo. O mercado de trabalho, com certeza, está sendo fortemente impactado. A relação entre trabalhadores e empresas não será de forma alguma como era antes. Vamos ter desafios enormes”, afirmou Ricken. “Então, é importante analisar as medidas provisórias, legislações e regulamentações que estão aparecendo. É oportuníssimo vocês da área jurídica nos proteger dessa realidade e nos orientar sobre como podemos cumprir fielmente a legislação nessa situação nova, nesse desafio novo”, completou.
MPs – O Seminário de Direito Cooperativo da Região Sul tratou sobre as MPs 927, de 22 de março de 2020, que dispõe sobre medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública; 932, de 31 de março de 2020, que altera as alíquotas de contribuição aos serviços sociais autônomos, e 936, de 1º de abril de 2020, que institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública.
Palestrante – A palestrante convidada para discorrer sobre os impactos dessas MPs nas cooperativas foi a especialista Leila Andressa Disenha, que é doutora e mestra em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR); especialista em Direito do Trabalho pela PUCPR e professora de Bases Legais do Cooperativismo do Programa da Pós-Graduação em Gestão de Cooperativas da PUCPR, ofertado em parceria com o Sistema Ocepar. “Nós estamos vivendo algo totalmente novo e excepcional. Então, realmente precisamos refletir e nos preparar principalmente para o futuro porque se o momento presente é complicado, o que pode estar por vir pode ser mais ainda”, disse Leila no início de sua explanação. “Nós temos que pensar no seguinte: como será o impacto de tudo que estamos vivendo agora daqui a dois anos, pensando em prescrição trabalhista?”, acrescentou.
Linha do tempo – De acordo com ela, é importante ter em mente a linha cronológica dos acontecimentos. “Em 12 de março, nós tivemos a primeira morte por Covid-19 no Brasil. Hoje, passamos de 100 mil. Nós tínhamos 5% a menos de desemprego no dia 12 de março. Hoje, são 5% a mais de desempregados neste país. Essa já é uma situação delicada por si só. Houve a decretação do estado de calamidade pública, algo que, para mim, pelo menos era inimaginável. E, na sequência, nós tivemos as edições das medidas provisórias, duas convertidas em lei, as MPs 932 e 936, e uma acabou perdendo a sua vigência, a MP 927, mas mantém situações que vão deixar suas cicatrizes e precisamos tratar disso”, frisou.
Temas – Leila selecionou alguns itens das legislações para abordar na palestra, devido à limitação de tempo. Ela falou sobre home office, matéria tratada na MP 927, e apresentou uma série de pontos de atenção que devem ser observados para a instituição de forma segura dessa modalidade de trabalho. “A MP 927 perdeu a sua vigência mas, de acordo com a Emenda Constitucional nº 32, ela teve efeitos enquanto estava em vigor. Os cuidados que temos que ter é em relação a esses efeitos, para que eles não tragam nenhum prejuízo”, disse. De acordo com ela, as empresas também devem se manter atualizadas quanto às normas relativas ao home office pois novas regras devem ser seguidas após a MP 927 ter perdido a validade.
Emprego e renda – Sobre a MP 936, que criou o Programa de Proteção do Emprego e da Renda, a palestrante lembrou que vários questionamentos existentes no período em que a medida provisória estava em vigor foram esclarecidos, com a sua conversão na Lei 14.020 e que, por meio do Decreto 10.422,22, de 13 de julho de 2020, o governo pode prorrogar o prazo das medidas. O programa abrange o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e Renda, a redução de salário e jornada e a suspensão do contrato de trabalho, entre outros itens. Em sua avaliação, a negociação coletiva é sempre o caminho mais seguro para as empresas que optarem pela redução salarial ou suspensão do contrato de trabalho visando manter seus negócios neste período de pandemia.
MP 932 – Em relação à MP 932, convertida na Lei 14.025, de 14 de julho de 2020, Leila destacou que, embora o governo tenha reduzido as alíquotas em relação ao Sistema S, alegando que a medida contribuiria para reduzir os impactos econômicos durante a pandemia, o tema já vinha sendo discutido anteriormente, provocou grande embate jurídico enquanto a MP estava em vigência, e as cooperativas devem ficar atentas. “É um assunto que corre o risco de voltar à tona”, disse.
Mensagem final – No fim de sua explanação, Leila deixou uma mensagem para as cooperativas. “Tenham muito cuidado mas também tenham muita flexibilidade porque a crise e a pandemia não vão afetar somente as cooperativas. Elas afetam também os empregados, ou seja, afetam na mesma medida patrões e empregados. Serão muitas perdas depois disso, não só perdas econômicas, mas, também perdas de vidas. Então, vamos ter mais solidariedade, mais flexibilidade, mas sem descuidar do futuro. Porque no futuro o que podemos ter é uma grande discussão sobre excepcionalidade daquilo que estamos fazendo hoje. E aí nós teremos que lembrar os juízes, os desembargadores, lá no futuro, que o momento que vivenciamos hoje não tem precedentes. Nós tivemos que aprender com o medo, com o receio da própria morte, aprender como trabalhar, como manter as atividades funcionando e manter as pessoas vivas e empregadas. Isso tem que ser lembrado com muito carinho daqui a dois anos, três anos”, destacou.
Painel – O evento contemplou ainda a realização de um painel que mostrou a visão das entidades representativas sobre o tema do Seminário. Mediado pelo assessor jurídico da Ocesc, Gilson Flores, contou com a participação da gerente sindical da Confederação Nacional das Cooperativas (CNCoop), Jucélia Ferreira, do assessor jurídico e sindical da Federação e Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Fecoopar), Graziel Pedrozo de Abreu, e do assessor jurídico sindical da Organização das Cooperativas do Estado do Rio Grande do Sul (Ocergs), José Pedro Pedrassani. Ao final, foi aberto um espaço para que os participantes pudessem esclarecer suas dúvidas.
OCEPAR – Sexta, 21 Agosto 2020 11:20