Técnicos foram convocados às pressas para discutir medidas tributárias
A intenção de taxar os lucros extraordinários da Petrobras deve vir acompanhada de uma autorização para que as despesas financiadas com essas receitas fiquem fora do teto de gastos.
A medida é um dos possíveis pontos de discussão na reunião de líderes convocada para esta segunda-feira (20) pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Brasília A intenção de taxar os lucros extraordinários da Petrobras, na esteira da alta nos preços do petróleo e de combustíveis, deve vir acompanhada de uma autorização para que as despesas financiadas com essas receitas fiquem fora do teto de gastos —regra fiscal que limita o avanço das despesas à inflação.
A medida deve ser um dos pontos de discussão na reunião de líderes convocada para esta segunda-feira (20) pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
A combinação das iniciativas também está no radar de integrantes do Senado, onde já tramita uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que busca destravar um repasse de R$ 29,6 bilhões fora do teto de gastos para subsidiar a redução de tributos estaduais sobre diesel, gás e etanol.
Segundo integrantes do Congresso e lideranças políticas, a PEC em tramitação pode ser modificada para incluir mais essa autorização. Um parlamentar afirma reservadamente que “há muita pressão nesse sentido.”
A política exata que seria bancada com esses recursos, porém, ainda está em discussão. São citados nos bastidores auxílio para caminhoneiros, taxistas e motoristas de app, além de um possível aumento no Auxílio Gás, subsídio para a compra de botijão por famílias de baixa renda.
tema também deve ser levado ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSDMG), que defendeu na sexta o uso do lucro da Petrobras para abastecer uma conta de estabilização de preços de combustíveis.
A forte alta do diesel e da gasolina é apontada como um obstáculo à reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL) e também preocupa seus aliados no Congresso, muitos dos quais buscarão a renovação do mandato este ano. Isso explica a determinação dos parlamentares em exibir aos eleitores alguma reação.
Os instantes que sucederam o anúncio oficial do novo reajuste pela Petrobras foram de intensa movimentação nos gabinetes do governo em Brasília, apesar do ponto facultativo em decorrência do feriado de Corpus Christi. Técnicos foram convocados de última hora para trabalhar em possíveis medidas para conter o impacto dos reajustes.
Uma das frentes envolve justamente a taxação dos lucros extraordinários da Petrobras, defendida publicamente na sexta por Lira, que chegou a falar em dobrar a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido). A Petrobras paga hoje a alíquota geral do tributo, que é de 9%.
A Receita Federal já está em prontidão para analisar a viabilidade da medida e estimar quanto seria arrecadado com eventual elevação da alíquota.
Segundo fontes ouvidas pela Folha, a medida considerada mais viável é a elevação da CSLL para empresas do setor de óleo e gás em geral, uma vez que não seria possível particularizar a cobrança extra sobre uma empresa. Modelo semelhante é adotado para bancos e instituições financeiras.
Seria inédita a previsão de uma tributação maior a partir de determinado preço de petróleo ou nível de lucro. Por isso, técnicos avaliam ser mais provável uma elevação da alíquota da CSLL para o setor.
Governo avalia converter ações para privatizar Petrobras
Integrantes do governo Jair Bolsonaro (PL) trabalham em uma minuta de projeto de lei para tentar avançar na discussão da privatização da Petrobras. A avaliação entre defensores da medida é que os aumentos anunciados pela empresa estão criando um ambiente político favorável ao tema no Legislativo. O envio do projeto também poderia alimentar o discurso do governo de que está agindo para solucionar o problema.
Segundo pessoas do governo ouvidas pela Folha ,um dos modelos analisados para a operação é a conversão de ações preferenciais da companhia (priorizadas na distribuição de dividendos, mas sem direito a voto) em ações ordinárias (com direito a voto).
Apenas essa transação já seria suficiente para diluir a participação da União na empresa. Com isso, o controle da companhia passaria para as mãos da iniciativa privada.
Para isso, o aval do Congresso é necessário porque a Lei do Petróleo, de 1997, proíbe o governo de se desfazer do controle sobre a Petrobras. Há quem veja dificuldades de do Legislativo conseguir avançar em um tema tão polêmico em ano eleitoral.
A empresa foi incluída no PPI (Programa de Parceria de Investimentos) pelo governo no início de junho, após o novo ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, prometer, em seu primeiro discurso, a realização de estudos para a privatização da companhia.
A conversão das ações é considerada a principal opção para a proposta avançar, mas ainda não houve uma de cisão final. Outras alternativas seriam a União vender parte de suas ações ordinárias, ou ainda realizar uma capitalização, com emissão de novas ações, a exemplo do que foi feito no caso da Eletrobras.
Qualquer modelo precisará passar pelo crivo das áreas jurídicas do governo e do Tribunal de Contas da União.
Além do projeto de lei autorizando a conversão das ações, a medida também demandaria uma mudança no estatuto da Petrobras. Tanto a Lei do Petróleo como o estatuto dispõem sobre a divisão do capital social em ações ordinárias e preferenciais.
A Petrobras tem hoje 13 milhões de ações negociadas em mercado, sendo 7,4 milhões ordinárias e 5,6 milhões preferenciais.
No caso das ações com direito a voto, a União tem o controle, com 50,26% de participação. Já nas preferenciais, a fatia do governo é menor, de 18,48% —essas ações estão na carteira do BNDES. Com isso, a parcela da União no capital total da empresa é de 36,61%, o que ilustra a perda de controle em caso de uma conversão integral das ações.
Segundo uma das fontes ouvidas, o projeto de lei em elaboração no governo também deve trazer alguns antídotos para que a operação não signifique uma mera troca do controle estatal por um monopólio privado.
Os detalhes dessas medidas ainda estão em discussão entre os técnicos, mas o diagnóstico é que a Petrobras é praticamente monopolista no mercado de refino, prejudicando a concorrência e permitindo a prática de preços mais elevados na venda de combustíveis.
Folha de S.Paulo 20 Junho 2022 Por: Idiana Tomazelli Idiana Tomazelli e Julia Chaib